Chama-se Tijane Freitas Reis e aos 19 anos tem uma história que já vale a pena contar. Uma história que mete Chelsea e Benfica, mas que termina em Mirandela. Por partes, antes de mais: nasceu na Guiné-Bissau mas praticamente não fala português. «Cresci na Guiné-Conacri e por isso só falo francês», explica.

Por estes dias joga no Mirandela, ou antes, não joga. Uma lesão impediu-o de defrontar, por exemplo, o Beira Mar. «Sinto-me frustrado», conta. «Era uma grande oportunidade e sinto que podia ter sido importante para a equipa. Mas é a lei da natureza, vou olhar em frente e concentrar-me na terceira divisão.»

Tijane fala com desenvoltura enquanto conta a sua história. Já treinou no Chelsea e veio para Portugal com a promessa de jogar nos juniores do Benfica. As voltas da vida atiraram-no para Mirandela, mas o avançado não deita a toalha ao chão. «Não há problema», repete constantemente. «Eu sei que vou chegar lá.»

Uma semana no Chelsea e a amizade de Essien

Lá, refira-se, é ao topo, que esteve muito perto quando treinou à experiência no Chelsea. Tinha na altura 17 anos. «Foi uma grande experiência», refere. «Não fiquei por ser extra-comunitário. Disseram-me para obter a nacionalidade portuguesa, por isso já dei entrada com o pedido e em breve espero ser português.»

Em Londres passou uma semana perfeita, que lhe permitiu até estabelecer laços com... Essien. «Fiz dois treinos com os juniores, fiz o resto dos treinos com a equipa de reservas e no meu último dia fiz um jogo-treino com equipa principal. Foi muito bonito, foi fantástico», diz com os olhos a brilhar.

«O Essien marcou-me de forma especial. Falou muito comigo, deu-me força para seguir com a minha vida quando lhe disse que não ia ficar por causa da nacionalidade. Disse-me que a vida nunca era fácil, mas que tinha de continuar a procurar o melhor. Deu-me muita moral e disse-me que ainda ia dar a volta por cima.»

A semana passada no Chelsea serve-lhe de combustível para alimentar todos os sonhos. «Quero jogar na liga espanhola ou inglesa. Há a possibilidade de voltar ao Chelsea quando for português, mas mesmo que não fique lá, sei que vou saltar para um clube de primeiro plano porque tenho qualidade para isso.»

A promessa de jogar no Benfica e a paragem de um ano

Com força de vontade, Tijane diz que agora só quer recuperar da lesão para voltar a jogar à bola. Mesmo que o Mirandela esteja muito longe da ilusão que traz com ele. Em Trás-os-Montes não há luxos: o salário não ultrapassa os 500 euros, mais refeições e alojamento num apartamento que divide com mais nove colegas.

O avançado diz que para já está bem assim. Antes, recorda, depois de regressar de Londres, jogava no Futebol Clube Canchungo, da Guiné-Bissau. Onde o sonho de ser estrela está muito mais longe. Pelo meio teve até uma doença que o impediu de assinar pelos juniores do Benfica e de jogar durante um ano.

Em Mirandela com a cláusula de um milhão de euros

Foi Bobó, antigo jogador do Boavista, quem o descobriu. «Deixei a Guiné com a promessa de vir jogar para o Benfica, mas fiquei doente e nunca joguei.» Abandonado à sua sorte. «Fiquei um ano sem jogar, até que me disseram para vir para o Mirandela porque aqui ia ter hipótese de mostrar o meu futebol.»

Pelo meio passou uma longa agonia. «Estive um ano aqui em Portugal sem jogar, foi um ano difícil, tive momentos de grande frustração e pensei muito na minha vida. Um jogador de futebol que não joga, é grave. Mas tive calma, pensei num dia de cada vez, concentrei-me em melhorar um bocadinho todos os dias.»

Recuperado da doença, Tijane diz que está bem agora. «Agradeço ao Mirandela o que fez por mim.» O Mirandela também agradece. O jovem tem aliás uma cláusula de rescisão de um milhão de euros. Em breve pode tornar-se a galinha dos ovos de ouro do clube transmontano. Desde que a sorte não o abandone outra vez.