Não houve milagre, mas houve dignidade no regresso das tardes europeias ao Bonfim. O empate (1-1) entre o Vitória e a Sampdoria deixa os italianos com um pé na fase de grupos e os portugueses com o ténue sonho do apuramento bem mais distante. Mas, convenhamos, não era realista exigir mais à equipa de Norton de Matos: o desfecho é um tributo à lógica e o reconhecimento de que o futebol nem sempre tem espaço para as surpresas. Depois, mais marcante que tudo o resto, houve o golaço de Tchomogo: um momento de perfeição absoluta que, só por si, chega para justificar a presença do Vitória nesta edição da prova.
Os cinco mil adeptos portugueses - a propósito, era mesmo preciso pôr bilhetes tão caros? - fizeram a festa possível, com 400 italianos a assistir. Fizeram-na antes do jogo, e nos dez minutos iniciais, quando a motivação ainda deu para disfarçar as diferenças de estatuto. Depois, voltaram a fazê-la após o remate mais bonito da vida de Tchomogo. E pouco mais. Mas foram para casa com o ego reconfortado: pelo menos a equipa mostrou não ter usurpado o seu lugar na festa.
Cozinha italiana: a receita de sempre
Como quase sempre acontece nos confrontos com portugueses, os italianos deixaram jogar e esperaram pelos erros. Houve quase sempre uma equipa a tentar, e outra a deixar que a bola girasse de pé para pé, controlando o jogo à distância e sem bola. Não é bonito, mas costuma resultar. E era pedir demasiado que fosse este Vitória a solucionar o problema que os portugueses sentem há mais de cinquenta anos perante o futebol de calculadora em punho.
Com todas as suas limitações, que uma simples comparação com as soluções de que dispunha na época passada tornam ainda mais gritantes, a equipa de Norton de Matos fez o que se podia esperar: teve um início desinibido, que rendeu aplausos, permitiu a Sougou alguns fogachos de «sprinter» e obrigou Antonioli a uma defesa. Depois, veio o filme tantas vezes revisto: no primeiro ataque italiano digno desse nome, um livre, uma dupla falha dos centrais vitorianos, e Flachi a aproveitar para bater Moretto, à segunda tentativa (14 m).
O entusiasmo sumiu-se do Bonfim como o ar de um balão furado. A meia hora seguinte foi francamente desinteressante: os italianos puseram o jogo no congelador e o Vitória, sempre corajoso, não disfarçava limitações que tinham no desacerto do ponta-de-lança Fábio Hempel a face mais visível.
Tchomogo salva o jogo
Veio o intervalo e com ele a expectativa para ver como poderia salvar-se o jogo de um pântano arrastado de bocejos. A resposta veio em 20 segundos: no lance do recomeço, Hempel tocou atrasado para Tchomogo que fora da meia-lua, resgatando uma exibição baça e confusa, encheu o pé direito para um remate sublime, ao ângulo esquerdo de Antonioli.
Voltou o entusiasmo e a esperança de tirar algo mais do jogo, tanto mais que a «Samp» esteve sempre muito longe do que se espera de uma sensação no «calcio» e não ia além de uns contra-ataques quase inofensivos. Mas, apesar da lucidez a tempo inteiro de Pedro Oliveira, da consistência táctica do esclarecido Dembelé e de algumas tímidas arrancadas de Sougou, havia pouco por onde incomodar os italianos.
Nem as entradas de Bruno Ribeiro (eficaz) e Franja (trapalhão) trouxeram algo de novo à partida. O tempo foi passando, a quebra física no Vitória tornou-se gritante, e o empate tornou-se o desfecho inevitável para a partida. Uma cabeçada de Bruno Ribeiro, a centímetros da glória (88 m) foi a última oportunidade para a surpresa aparecer. Não apareceu, deixou-se estar à porta. Ficou o pontinho, ficou a dignidade intacta. E ficou também a ilusão, mantida ao longo de 90 minutos, de que as diferenças entre uma equipa portuguesa de classe média-baixa e uma equipa italiana de classe média-alta não são tantas como isso. Já não é pouco.