Edinho acabou de treinar no Erciyesspor e tinha 12 chamadas não atendidas no telemóvel: era a esposa a tentar avisá-lo que Portugal o tinha chamado de novo. Exatamente cinco anos antes, o primeiro telefonema de Carlos Queiroz a convocá-lo para a estreia também se tinha perdido. Se o timing de Edinho com as convocatórias tem sido atribulado, o momento em que tudo aconteceu agora encontrou-o no ponto certo, à hora certa. Há um mês estava sem espaço em Braga, hoje marca golos a um ritmo impressionante na Turquia e entrou na última lista de Paulo Bento antes da escolha final dos 23 para o Mundial. Frente aos Camarões saiu do banco ao intervalo, marcou um golo e, no meio de um poço de interrogações em torno dos pontas de lança da seleção nacional, aí está ele como candidato a um bilhete para o Brasil.

Leiria foi a sua sexta internacionalização, quase quatro anos e meio depois da última. E assinalou o seu terceiro golo com a camisola das quinas, um registo notável.

Edinho, agora com 31 anos, andou muito para chegar de novo à seleção. E mudou muito de ares. No início de fevereiro deixou o Sp. Braga, onde tinha regressado no defeso, e rumou à Turquia, para jogar no Kayseri Erciyesspor. Foi à procura de jogar mais, sempre de olho no regresso à seleção. Num mês, marcou seis golos em cinco jogos no seu novo clube. Uma adaptação relâmpago, que lhe valeu esta chamada de Paulo Bento.

Edinho falou com o Maisfutebol sobre este mês de sonho, em que passou de suplente em Braga a opção para a Seleção Nacional. «É um bom momento, talvez o melhor momento da minha carreira. Ter vindo para cá foi a melhor opção que tomei», diz: «Tinha este sonho de regressar à seleção. Sabia que só jogando e mostrando que tenho condições podia acontecer.»

«A minha primeira intenção não era sair do país no início da época, foi por isso que fui para Braga», prossegue. Mas as coisas não correram bem neste regresso ao clube que já tinha representado no início da sua carreira. Edinho começou por ser opção de Jesualdo Ferreira, mas com os resultados a não aparecerem acabou relegado para segundo plano. A tentar explicar o que correu mal, fala de várias razões e não esconde alguma amargura com o treinador que entretanto também já não está no clube.

«Havia muitos jogadores novos, a adaptar-se, a equipa ainda não estava rotinada. Quando a equipa começou a carburar não fui opção. Falava com o mister, ele dizia que eu trabalhava bem, mas os outros tinham margem de erro e eu não. Achei que não estava a ser correto comigo», diz: «O mister já tinha mostrado que não contava comigo, chegou a pôr o Pardo na posição de avançado.»

O último ano é um bom retrato do que tem sido a carreira de Edinho, um percurso que passou por muitos clubes e quatro campeonatos diferentes e que o colocou na órbita da seleção sem nunca ter passado por um dos grandes. Terminou a temporada passada na Académica, onde esteve ano e meio cedido pelo Málaga. Em Coimbra despediu-se com 13 golos marcados na Liga, 18 em todas as competições. O seu vínculo ao clube espanhol terminou no final da época e, depois de alguma indefinição, assinou pelo Sp. Braga. 

«Não dá aqui, tem que dar noutro lado»

Nascido em Aveiro, filho do antigo jogador Arnaldo Silva, Edinho começou a jogar na margem sul do Tejo. Almada, depois Barreirense, antes de assinar pelo Sp. Braga. Depois de chegar à equipa principal do clube minhoto, seguiram-se duas épocas consecutivas de empréstimo, primeiro ao P. Ferreira, a seguir ao Gil Vicente. Em 2007/08 rumou ao V. Setúbal e, depois de uma boa primeira metade de época, mudou-se para o AEK Atenas. Primeiro por empréstimo, depois em definitivo. Estava na Grécia quando chegou pela primeira vez à seleção sub-21 e também quando Carlos Queiroz o chamou à seleção AA.

Em 2009/10 assinou pelo Málaga. Jogou a primeira metade da época em Espanha, antes de nova saída para a Grécia, agora para o PAOK, por empréstimo. Voltou ao clube espanhol na época seguinte, com Jesualdo Ferreira a treinador, mas saiu de novo em janeiro, de volta a Portugal, para o Marítimo. Seguiu-se a Académica e então de novo Braga.

Edinho explica assim esta carreira feita de tantas mudanças: «Nunca fui de me acomodar nem tive medo de enfrentar novos desafios. Não dá aqui, tem que dar noutro lado. Jamais me deixarei abater por alguns insucessos. Não tem sido fácil, mas é como muitas vezes me diz um grande amigo de Braga, Deus dá as maiores batalhas aos melhores guerreiros.»

«Na minha carreira tenho batalhado muito. Saiu-me do corpo, mas olho com satisfação para o que consegui», insiste, enquanto conta que o comboio dos «grandes» portugueses chegou a passar perto. «O Benfica foi hipótese na altura do José Antonio Camacho, estava bem encaminhado, mas ele acabou por sair e não se proporcionou. Este ano tinha a possibilidade do Sporting, quando não se sabia quem era o treinador, mas não aconteceu. Optei pelo Braga, é um clube que eu amo e era meu desejo e da minha família voltar para casa..»

Edinho diz que não muda por mudar: «A minha ambição é sempre dar o máximo de mim, conseguir mais e mais. Se estiver bem num clube quero melhorar nesse clube.»

Um mês, cinco jogos, seis golos na Turquia

Não estava bem em Braga e saiu. A opção foi o Kaisery Erciyesspor, então último classificado do campeonato turco, por empréstimo até ao final da época. O clube mudou de treinador em dezembro, na reabertura de mercado foi buscar vários jogadores e tem vindo a recuperar. Desde o ínicio de fevereiro ganhou quatro jogos e empatou um, nesta altura deixou a lanterna vermelha.

Edinho tem sido fundamental na recuperação, já é o melhor marcador da equipa. A adaptação a um país e a um futebol diferente não foi problema, diz. «É uma cultura diferente, um país muito conservador, mas o ambiente no clube é muito familiar. Acolheram-me muito bem, e as coisas estão a resultar», conta. Mesmo sem portugueses para facilitar a adaptação, encontrou pontes: «Os que me estão mais próximos são o Pape Diakhité (defesa senegalês), que jogava no Granada e eu já conhecia, o central Kader Mangané. São africanos e eu também falo francês. Mas todos me têm ajudado.»

Para já, a família ficou em Portugal. Foi de onde ligou insistentemente a esposa no dia da convocatória, depois de ter ouvido o nome de Edinho em direto na televisão. O avançado sorri ao contar a história, ele que em março de 2009, quando foi chamado pela primeira vez por Carlos Queiroz, só soube depois de os jornalistas terem dado a notícia, porque tinha saído de casa para comprar leite em pó para o filho : «Desta vez estava no treino. Quando acabou tinha 12 chamadas da minha esposa. Sabia que ia sair a convocatória, mas naquela altura não associei. A primeira coisa que pensei é que se passava alguma coisa com o meu filho na escola. Ela está disse-me toda emocionada que tinha sido convocado. Primeiro até fiquei um bocado chateado com ela, perguntei porque é que não tinha mandado mensagem, que tinha ficado preocupado. Depois é que comecei a cair em mim.»

Com Carlos Queiroz Edinho foi utilizado em cinco jogos, três dos quais na qualificação para o Mundial 2010. A última vez foi em novembro de 2009. Depois disso, com uma lesão pelo meio quando estava no PAOK, ficou fora das escolhas para a África do Sul.

Não voltou à seleção, até agora. Mas nunca deixou de esperar, até porque ao longo deste tempo continuou de forma regular sob observação de Paulo Bento: «Tinha sempre a esperança. Estava sempre pré-convocado, era o motivo da minha esperança. Sempre confiei no meu trabalho e no meu valor. Coincidiu com um período em que o Hélder Postiga, o Hugo Almeida, o Eder, o Nélson Oliveira estavam num bom momento, dificultou a que fosse chamado. Mas sabia que o Paulo Bento estava atento. Sabia que se estivesse bem e a fazer golos tinha hipóteses.»

Agora, com Hélder Postiga lesionado e Hugo Almeida limitado (acabou mesmo por ser dispensado), Paulo Bento voltou a chamá-lo. Na concentração, o selecionador não lhe deu qualquer indicação especial. «Deu-me as boas vindas, perguntou como estava, como estavam a correr as coisas.»

Passou muito tempo desde a última vez, mas Edinho não se sentiu estranho no grupo, longe disso. «Já conhecia o grupo, já conhecia quase todos. Tirando o Neto e o William Carvalho, não estou a ver ninguém que não conhecesse. Vamos jogando uns contra os outros e vai ficando aquela amizade.»

No dia do jogo, Paulo Bento começou por testar um sistema tático alternativo, sem um ponta de lança de raíz. Na segunda parte voltou ao esquema habitual e Edinho entrou, como referência de ataque. Portugal construiu a goleada nesse período e o avançado marcou o 4-1, na recarga a um primeiro remate de Cristiano Ronaldo. 

 

No final o capitão de Portugal, que nesse jogo se tornou o melhor marcador de sempre da Seleção Nacional, deu-lhe os parabéns. O que Cristiano fez, do ponto de vista de um ponta de lança, é ainda mais notável. «O Cristiano mais uma vez provou que é um jogador de exceção, uma pessoa fantástica. Tenho-o como exemplo. Deu-me os parabéns. Dou-me muito bem com ele. E com o Raul, o Pepe, o Coentrão. Não tenho dúvidas que ficaram contentes por eu ter voltado.»

Estrela no Youtube, e aquele pormenor «não foi sem querer»

No Portugal-Camarões Edinho também teve um pormenor técnico que chegou ao Youtube e correu mundo nos dias seguintes, em muitos sites internacionais e nas redes sociais: receção de costas com um calcanhar e um toque com o outro, a fazer a bola passar sobre o corpo para a apanhar mais à frente. 

Este vídeo já tem mais de 200 mil visualizações:

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Edinho acompanhou a repercussão que teve esse momento. E sorri: «Toda a gente diz que foi sorte, que fiz ao calhas, mas se virem bem, eu estou sempre a olhar para a bola. Queria mesmo fazer aquilo.» Até deixa uma promessa: «Vou fazer outra vez para verem que não foi por acaso.»

Saiu pouco depois, a seguir a uma pancada que levou o médico da seleção a recomendar que deixasse o campo, por precaução. «Lesionei-me no lance seguinte, ia tentar o chapéu, era a cereja no topo do bolo.»

Faltam dois meses para a convocatória final de Paulo Bento. Edinho sonha, mas não quer fazer contas às suas hipóteses. «Tenho que continuar a trabalhar da mesma forma. Sei que os meus colegas também querem o mesmo. Todos estão a trabalhar para o mesmo objetivo», diz, notando que, mesmo que falhem algumas opções habituais, não está sozinho na corrida: «Há mais pontas de lança. O que eu tenho de fazer é manter o meu trabalho.»