O médico legista espanhol Francisco Aguanell morreu na segunda-feira, vitimado por ataque cardíaco, dois dias antes de testemunhar no julgamento da Operação Puerto, que decorre em Espanha. Aguanell, de 52 anos, foi o médico responsável pelos exames ao ex-ciclista Jesús Manzano, o primeiro a denunciar práticas de doping no ciclismo espanhol e a incriminar o médico Eufemiano Fuentes, considerado o principal responsável por uma rede de tráfico de substâncias dopantes, cuja dimensão ainda não está definida.

Manzano foi examinado por Aguanell, em final de dezembro de 2012, para avaliar os problemas de saúde que alega ter passado a sentir, devido ao consumo de substâncias dopantes. O médico legista iria expor as suas conclusões perante um tribunal que, desde janeiro deste ano, procura encerrar o processo iniciado em 2006, por uma investigação da Guarda Civil.

A denúncia de Manzano, que deu início a todo o processo, aconteceu em março de 2004, em declarações ao diário As. Já então, o ex-ciclista apontava Fuentes como cérebro da organização e identificava procedimentos e clínicas coniventes numa vasta rede com ramificações em França, Alemanha e Itália, para além de Espanha. Foi o seu depoimento a desencadear a investigação da Guarda Civil, que num primeiro momento indicava a presença de ciclistas, tenistas, futebolistas e atletas na lista de clientes do doutor Fuentes.

Posteriormente, por ordem judicial, que restringiu a documentação consultada no processo, apenas 58 ciclistas foram identificados como clientes. Mas, como a prática de doping não estava criminalizada em Espanha, o processo acabou por ser arquivado numa primeira fase. No entanto, esse foi o ponto de partida para investigações posteriores, na Alemanha, em Itália e novamente em Espanha, desta vez com o enquadramento legal de crime contra a saúde pública.

O julgamento de Eufemiano Fuentes, que decorre desde janeiro, tem levado ao banco de testemunhas vários nomes de topo do ciclismo espanhol e europeu da década passada, mantendo-se em aberto as implicações da rede de doping em outras modalidades. Fuentes, o cérebro de toda a operação, já teria admitido, no início do julgamento, a disponibilidade para identificar todos os seus clientes de outros desportos, mas a juíza que preside ao caso, Julia Santamaria, rejeitou essa necessidade, inviabilizando assim um pedido do Comité Olímpico Italiano. A restrição do processo ao ciclismo tem sido alvo de críticas de diversos ex-ciclistas, envolvidos ou não no julgamento.

Como efeito colateral do julgamento, na semana passada, Iñaki Badiola, ex-presidente da Real Sociedad, acusou o clube basco de ter comprado produtos dopantes com recurso a um saco azul, nos seis anos anteriores à sua presidência. O antigo dirigente, que foi presidente da Real Sociedad em 2008, admite também que a sigla «Rsoc» que aparece na documentação de Eufemiano Fuentes, o médico no centro da Operação Puerto, seja uma referência à Real Sociedad. O presidente da Real Sociedad à data dos facto relatados por Badiola era o atual presidente da Liga Espanhola, José Luis Astiazarán, que desmentiu todas as acusações em comunicado.

Nesta quarta-feira, sem o depoimento do falecido Francisco Aguanell, ficam agora agendados os testemunhos de Jesus Manzano e do perito da agência mundial antidopagem, Olaf Schumacher.