Ao trocar o FC Porto pelo Al Rayyan, Lucho González tornou-se o último exemplo da atração crescente da Península Arábica pelo futebol português. Clubes do Qatar, Emirados Arábes Unidos ou Arábia Saudita têm aumentado as incursões ao nosso país, nos últimos tempos.

Basta pensar em José Peseiro, ou em Hugo Viana e Carlos Carvalhal, que estão no Al Ahli do Dubai. Mas o principal caso é o outro Al Ahli, o saudita. Primeiro decidiu entregar a formação aos treinadores portugueses, ao abrigo de um protocolo com o Sporting, para depois estender a aposta ao futebol sénior. Comprou Bruno César ao Benfica e recrutou o treinador que foi bicampeão nacional com o FC Porto. E já com Vítor Pereira ao leme contratou Mossoró, Suk e Luís Leal.

O avançado comprado ao Estoril chegou há menos de dois meses, mas para já faz um balanço positivo. Ainda que o início não tenha sido o mais feliz. «Fiz dois jogos assim que cheguei, mas empatámos um e perdemos o outro. E depois lesionei-me. Regresso agora no último jogo [sexta-feira], e penso que fiz uma boa exibição. Agora é continuar a trabalhar para ajudar a equipa», diz o avançado à
«MF Total».

Luís Leal assume que a proposta saudita «era muito boa, bastante tentadora». «Para mim e para o Estoril. Não havia motivo para dizer que não», reconhece. Mesmo que outros emblemas estivessem também interessados nos seus serviços. Falou-se com alguma insistência no Sporting, por exemplo. «Por acaso não era essa possibilidade», diz o avançado. De tentativa em tentativa chegamos ao Sp. Braga e ouvimos um sorriso do outro lado da linha. «Soube apenas por alto, pois as coisas com o Al Ahli já estavam encaminhadas. Vim para cá no início de dezembro, e o mercado em Portugal só abria em janeiro. Se tivesse sido mais cedo talvez se tivesse concretizado», admite.

As portas que fechavam, sem arrumar o sonho do «salto»

Embora tenha sido apontado a clubes com outras ambições, Luís Leal sente que algumas portas já estavam a fechar-se, por causa da idade. E isto na perspetiva de alguém com apenas 26 anos. « Os clubes grandes já não apostam muito em jogadores da minha idade. Procuram jogadores para o futuro, com a minha idade já é difícil. Com 21 ou 22 anos teria mais oportunidades», defende.

«Preferem ter jovens para mais tarde ver o que vai dar, para encaixar uma boa quantia no futuro. Mas assinei um contrato de um ano, tenho ainda ambição, tudo pode acontecer. Nos últimos tempos senti que podia chegar a um grande», ressalva.

Não se trata propriamente daquela oportunidade de fazer um último grande contrato. Aquilo com que Lucho se deparou, no fundo. «Ele terá agora objetivos diferentes. Estaria à espera de um novo projeto, algo diferente, com menor pressão. Em breve vão começar a vir mais jogadores para estas paragens», calcula o jogador português.

Muitas vezes a estadia nestes países é curta, mas Luís Leal garante que não está a pensar já numa mudança. A adaptação à Arábia Saudita e ao Al Ahli está a correr bem. «O balanço é bastante positivo. Não conhecia o país, mas desde o primeiro dia que gostei. É tranquilo, com um clima sempre bom», diz à «MF Total».

A rotina marcada pelas pausas para rezar

O jogador português foi encontrar uma cultura bem distinta, mas não teve dificuldades até ao momento. A língua é um obstáculo óbvio, mas não impede que Luís Leal vá criando rotinas.

«Aqui as pessoas deitam-se tarde e levantam-se tarde, habitualmente. Eu acordo por volta das dez, dez e meia. Depois almoço por casa ou vou ao centro comercial, que fica a dois minutos a pé. Nem é preciso ir de carro. Uma curiosidade é existirem filas para homens e outras para mulheres, nas lojas», relata.



De volta à rotina. «Descanso um pouco durante a tarde, e depois temos treino pelas 18h30, normalmente. O jantar normalmente é em casa, pois já fica um bocado tarde», acrescenta.

Luís ainda não conduz em Jedá, mas vai começar a fazê-lo na semana que agora se inicia. Era apenas uma questão burocrática, ainda que as viagens prometam ser uma aventura.

«Estava só à espera de um documento do clube. Aqui há menos regras na estrada. Há muito buzinão, passam da faixa da esquerda para a direita de repente. É uma questão de hábito», acredita.

Uma novidade para Luís Leal é as pausas nos treinos para rezar. «Há horários para as orações, e as pessoas param para isso. O centro comercial fecha, por exemplo. E no treino começa a tocar a música e paramos. Os jogadores não se sentam para rezar, mas durante aquele bocado ninguém treina. Vamos conversando uns com os outros», explica.

Os métodos de treino não mudaram substancialmente, uma vez que o treinador é português, e teve naturalmente um papel preponderante na contratação do avançado. «Fui uma aposta direta dele, e agora quero corresponder para o deixar satisfeito», afirma.

A importância da «net», de Vítor Pereira à família

Vítor Pereira que protagonizou recentemente dois vídeos muito comentados pelos portugueses nas redes sociais, e que mostravam o técnico muito exaltado em conferência de imprensa. «O primeiro vídeo era de um jogo importante, que a equipa perdeu. Até estava a jogar bem, mas o nosso defesa esquerdo foi agredido. O árbitro não viu, ou não quis ver. O nosso jogador reagiu mal, com uma entrada para vermelho. Prejudicou a equipa, e por isso o Vítor disse que ele não tinha sido profissional. Aqui não deram muita importância aos vídeos. Eu não brinquei com ele por causa disso, nem vi ninguém brincar. Talvez os adjuntos, ou os amigos de Portugal se tenham metido com ele», diz Luís Leal.




A conversa centra-se então na internet, «a melhor amiga» por estes dias. «Ajuda a passar as horas. Passo algum tempo em contacto com a família. Em Portugal já usava bastante o computador, mas agora ainda mais. É que ainda para mais tenho um filho, e através do Skype posso falar com ele, saber como está a escola. É difícil, mas a família entende e apoia.»

Luís Leal não teve sequer a oportunidade de vir a Portugal no Natal. Passou-o em casa de Mossoró. «Ele já tem cá a família. Chegou mais cedo, e para quem é casado fica mais fácil conseguir os documentos. Convidaram-me para passar lá o Natal. Foi diferente, foi um gesto bonito deles. Somos colegas e procuramos dar ajuda uns aos outros», relata à «MF Total».

Dois meses depois de ter partido para Jedá, as saudades já apertam. Da família, mas também do Estoril: «Foram dois anos em que passei grandes momentos. A força do Estoril é a união.»

A internet permite também ver os jogos da antiga equipa, assim como de Benfica, Sporting e FC Porto, ou mesmo de outras ligas europeias. «O Estoril está a jogar da mesma forma. Está a jogar ainda melhor. Os adversários têm respeito, e isso nota-se em campo. Podem alcançar a Liga Europa novamente, embora seja difícil», afirma o avançado, antes de falar de Marco Silva.

«Muito brevemente estará num dos grandes. Qual, não sei. Mas toda a gente está à espera disso. E pelo que tem feito é mais do que merecido», defende.