Josué abriu caminho para a vitória do F.C. Porto no clássico. Uma vez mais, assumiu a cobrança de um castigo máximo, afastando progressivamente o fantasma que pairava sobre o plantel azul e branco. O utilitário de Paulo Fonseca volta a comprovar a sua fiabilidade.         

Filho do dragão, o médio cumpre o sonho neste regresso a casa. Frente ao Sporting, marcou e abriu caminho para a obra de arte de Danilo. Tudo começou numa grande penalidade, mais uma a pedir serenidade e confiança. Josué não virou a cara.

Na época passada, os adeptos portistas tremiam a cada castigo máximo. O péssimo aproveitamento dos dragões nesse capítulo chegou a colocar em causa a revalidação do título. Em doze oportunidades, o F.C. Porto aproveitou apenas sete.

Jackson Martínez chegou ao limite com três penáltis desperdiçados. James Rodriguez e Lucho González falharam apenas por uma vez, com o argentino a redimir-se na Mata Real, no triunfo frente ao Paços que garantiu o tricampeonato.

Paulo Fonseca chegou ao clube sem afastar o trauma com a fórmula do passado. Na pré-temporada, frente ao Galatasaray, Jackson e Lucho tremeram novamente.

O F.C. Porto iniciou a época com o problema por resolver. Em Setúbal, apareceu o presente com veneno, como se de um desafio se tratasse. Josué estava em campo, como falso extremo. Assumiu e não desperdiçou. Estava encontrada a solução.

Nunca tinha marcado um penalty na Liga

Josué tem nesta altura quatro golos marcados, todos da marca dos sete metros. No Estádio do Bonfim atirou para a direita, em força. A partir daí, prefere deixar cair o guarda-redes para esse lado e rematar em jeito para a esquerda. Assim foi frente a Marítimo, V. Guimarães e Sporting.

O fantasma desapareceu. Paulo Fonseca ganhou a aposta, o risco assumido em Setúbal. Afinal, Josué nunca tinha marcado um penalty (nem um golo, aliás) na Liga portuguesa.

«No Paços de Ferreira ele fazia parte do lote que marcava os penáltis, mas o primeiro era o Manuel José. Também havia o Vítor. Tínhamos bons batedores de bolas paradas, eles treinavam bastante esses lances e com bom aproveitamento», explica Cássio, antigo guarda-redes dos castores, ao Maisfutebol.

Josué chegou à Capital do Móvel em 2011. Na primeira época marcou apenas um golo, num castigo máximo frente ao Estoril, mas para a Taça da Liga. Para o campeonato, havia Manuel José, Vítor e Michel, pelo menos até final da temporada. 

«Ele consegue muitas vezes enganar o guarda-redes. Mas atenção: marcar nos treinos é uma coisa. Conseguir fazer o mesmo nos jogos, com toda a pressão, é muito mais difícil. E o Josué tem respondido da melhor forma», considera Cássio, agora guarda-redes do Arouca. 


O Paços de Ferreira beneficiou de duas grandes penalidades na época passada, para a Liga, mas ambas foram convertidas por Manuel José. Para a Taça de Portugal, frente ao modesto Lourinhanense, seria Vítor a apresentar-se como o nome seguinte na hierarquia. O atual jogador do Sporting bateu o primeiro castigo máximo, Josué foi chamado para o segundo. Deixou a sua marca na goleada (0-6). 

Dezembro de 2012 foi o mês de mudança para Josué. Começou com o jogo para a Taça, seguindo-se a titularidade para o campeonato (frente ao V. Guimarães). Pelo meio, marcou mais quatro golos,em dois jogos  da Taça da Liga. Paulo Fonseca domou o talento, após inúmeras tentativas. O jogador viria a relatar o momento decisivo. 

«O Luiz Carlos estava suspenso e era eu que ia jogar. Só que tinha uma multa (320 euros) de excesso de peso para pagar e disse que não o faria porque dava para muito leite para a minha filha. O jogo era domingo e na quinta antes do treino o Paulo Fonseca perguntou-me se ia pagar. Eu disse que não. No fim repetiu e voltei a dizer não. E ele disse que então não me podia pôr a jogar porque o iriam olhar de maneira diferente. Eu voltei a dizer que não ia pagar e ele disse que me iria pagar a multa. Eu senti vergonha e paguei eu. Comecei então a jogar. Foi aí o clique», explicou o médio à revista Dragões.

«Josué cresceu muito no último ano»

Tudo mudou deste então. Para trás ficavam dezenas de episódios, inúmeras demonstrações de mau-perder, de um feito complexo, aparentemente incontrolável. Não restam dúvidas: o nascimento da filha e o contacto com Paulo Fonseca contribuíram para uma mudança de mentalidade.

«Um filho traz mais maturidade, mais responsabilidade. O Josué cresceu muito no último ano e está a demonstrar a sua força mental. Digo sempre que uma mudança tem de partir do próprio jogador. Acredito que isso aconteceu com o Josué», salienta Cássio, antigo companheiro de equipa.

Paulo Fonseca rendeu-se, o F.C. Porto também. O médio voltou a casa e o treinador foi ajeitando as peças até encontrar um espaço para a sua aposta. Começou como médio interior e passou a extremo direito, depois de ter experimentado o lado esquerdo na época passada, para conviver com o talento de Vítor.

«A parceria entre o Paulo Fonseca e o Josué tem dado frutos e vai ser para manter. Há muita confiança entre eles», remata Cássio.

Josué não garante velocidade estonteante para o flanco, como não garantia segurança extrema como membro da dupla de pivots. Se fosse um veículo, seria um utilitário. Fiável, regular, prático. Imprescindível.