Há jogos cuja chave mora num único lance, um momento que sentencia 90 minutos bem ou mal jogados, a remeter todos os restantes para as fronteiras da inutilidade. A vitória do Benfica sobre o V. Guimarães (2-0) foi um desses: tudo começa e acaba no momento em que Guga, sobre a linha de golo, evitou um golo de Fehér com a mão, travestindo o seu mergulho de cabeçada.

Pedro Henriques não foi na conversa, assinalou penalty e expulsou o brasileiro, que estava a ser um dos melhores da sua equipa. O golo encarnado ficou adiado apenas por alguns segundos - Zahovic não falhou o castigo - e o V. Guimarães deixou, a partir daquele momento de poder ser a equipa compacta, lúcida e venenosa que demonstrara ser durante a primeira meia hora. O Benfica passou a ter o jogo na mão, e o seu mérito maior, até final, foi ter conseguido passar por cima de uma tarde desinspirada para gerir o avanço.

Se Inácio pudesse escolher...

Se Augusto Inácio tivesse podido escolher, seguramente teria obrigado Guga a tirar a mão naquele instante. O remate de Fehér ia mesmo para a baliza, não há dúvidas, mas por certo o treinador do V. Guimarães teria preferido continuar a discutir o jogo de onze para onze, mesmo em desvantagem. Até aí, os indicadores eram-lhe favoráveis: depois de 4/5 minutos muito pressionantes por parte do Benfica, o primeiro esboço de ataque dos visitantes ia resultando em golo e a partir daí o jogo começou a inclinar-se para o lado dos brancos.

O Benfica, com Simão em dificuldades físicas, a ser muito cedo substituído por precaução, tinha recuperado Tiago para o meio-campo, mas mesmo ganhando certeza de passe não ganhara ritmo nem intensidade em relação aos jogos com Lazio e Boavista. Guga e Nuno Assis, bem apoiados por um esclarecido Hugo Cunha, eram bem mais perigosos do que o desacompanhado Fehér, e Moreira passou por mais apuros do que o estreante Miguel.

No entanto, aos poucos, já depois de Guga ter enviado uma bola ao poste, a ala direita dos encarnados equilibrou as operações e obrigou mesmo Inácio a substituir um alheado Rubens Júnior por um Djurdjevic mais consistente no apoio à defesa. Miguel e Geovanni fabricavam as melhores jogadas do Benfica, o Vitória perdia fulgor e o jogo estava em situação de empate técnico quando o guarda-redes Miguel (alternou defesas difíceis com dois erros comprometedores) falhou uma saída num livre de Zahovic. A bola sobrou para Fehér, e Guga, numa fracção de segundo, tomou a tal decisão errada que estrangulou o jogo de vez.

João Pereira, Miguel e nada mais

Sobre a segunda parte, pouco há a dizer tão fraquinha ela foi. O Benfica geriu o avanço sem brilho, o V. Guimarães já não conseguiu superar as limitações da traição de Guga e o futebol sumiu-se todo, devagarinho, pela porta da Maratona do Jamor. Todo? Quase todo: os últimos minutos trouxeram pelo menos a confirmação da forte personalidade do jovem João Pereira, muito confiante apesar de ter entrado para extremo-esquerdo, ele que é lateral-direito.

Poucos segundos depois de Fangueiro ter desperdiçado um excelente contra-ataque do Vitória, foi de lateral-direito para lateral-direito que se cozinhou o segundo e definitivo golo encarnado: João Pereira isolou Miguel com um passe fantástico, o número 23, melhor em campo, pôs o golo no caminho de Fehér. A missa estava dita, embora os adeptos do Benfica não saíssem do estádio Nacional tranquilizados, face à proximidade do jogo com a Lazio, que vai exigir muito mais aos jogadores encarnados.

Pedro Henriques foi muito contestado, quase sempre sem razão. Tem um critério largo que não é bem entendido pelos hábitos reboleiros dos jogadores portugueses, mas que faz mais bem que mal ao espectáculo. Correcto o penalty e a expulsão de Guga, tal como nos pareceu correcta a decisão de não expulsar Bruno Alves quando o central derrubou Fehér (73 m). É verdade que o central era o último homem da defesa, mas o húngaro tinha ainda um longo e sinuoso caminho a percorrer até à baliza, uma vez que a bola lhe fugira para o lado esquerdo.