Não era preciso ser mago ou prestidigitador para perceber logo à partida, no Verão passado, que dois egos do tamanho dos de José Mourinho e Jorge Valdano dificilmente caberiam num clube - mesmo num clube com a grandeza do Real Madrid. E sobretudo dois egos com concepções radicalmente diferentes do futebol.

O jogo era à partida interessante: Valdano mais espontâneo e liberto em campo, escudado no histórico consolidado em Madrid; Mourinho mais cerebral e cauteloso, escudado no histórico acumulado em clubes diferentes de países diferentes.

Esperava-se um Valdano mais ofensivo. Sem surpresa, foi o que sucedeu. Ataques discretos, mas constantes. Mourinho foi-se defendendo como se esperava: com resultados. Vitórias ao domingo e à quarta, consecutivas.

E o jogo foi permanecendo empatado. Viram-se aproximações de Valdano em ataque continuado e respostas de Mourinho em contra-ataque. Sem que nenhum marcasse. Quando Mourinho atacou directo (folha de papel em conferência de imprensa com lista de erros do árbitro contra os quais queriam que desse a cara), Valdano usou a arma do estatuto e obrigou Mourinho a dizer publicamente que não tinha qualquer problema com o director-geral. Bola ao poste em vésperas de Natal.

Não sem ironia, Valdano tem um aliado fortíssimo: o Barcelona. Um papa-recordes, uma máquina demolidora, uma delícia para quem gosta de ver jogar futebol. Diria mesmo, pensando na filosofia sobre o jogo, que Valdano era o director desportivo ideal para Guardiola e Guardiola o treinador ideal para Valdano.

O Barcelona é aliado de Valdano porque não dá tréguas na Liga e qualquer deslize do Real pode ser fatal para Mourinho. O empate de domingo com o Almería foi só mais um pretexto para o argentino lançar veneno. Um ataque daqueles que parecem destinados a dar golo. Acontece que Mourinho respondeu forte. Foi para a sala de imprensa com ar de quem nem queria falar do assunto, mas aproveitou bem um espaço vazio e atirou que já é muito adulto para receber recados pelos jornais.

Bola ao poste. Porque Valdano se viu obrigado, no dia seguinte, a garantir que não tem qualquer problema com o Especial.

Está um jogo de zero-zero. É um resultado ao jeito de José Mourinho, capaz de desgastar o adversário com uma organização e um planeamento eficazes e lançar um ataque decisivo na altura certa. Do outro lado está Valdano, sangue argentino, amor pelas artes e potencial para decidir tudo numa jogada de mestre. Ou duas. O árbitro, Florentíno Pérez, para já tenta apenas que o jogo não descambe. No Verão logo se verá quem ganha. Sim - porque a ida a prolongamento em 2011/2012 parece de todo improvável.

*Editor Desporto TVI