A FIGURA: Andrés Iniesta

Continua a ser um pouco estranho vê-lo ali, órfão de Xavi. É um dos resistentes da Espanha dos três títulos e mantém praticamente intactas as qualidades que o levaram ao topo. É, ainda, nelas que Espanha acredita para tentar o inédito «tri» europeu. Foi a partir delas que chegou o primeiro triunfo em França.

Falamos do estilo de sempre, da classe mais do que reconhecida e do talento a transbordar. Iniesta foi tudo isto contra a República Checa, num jogo (quase) de sentido único, em que Espanha não entusiasmou mas salvou a vitória sobre a meta.

E garantiu-a quando Iniesta descobriu Piqué na área para, com um cruzamento certeiro, dizer a um dos mais polémicos internacionais espanhóis da atualidade: ‘toma lá, faz as pazes com o público’.

Iniesta, eleito o melhor jogador do Euro 2012, entrou a todo o gás no torneio francês. Levou a Espanha às costas e ajudou a alargar uma estatística que impressiona: há doze anos que Espanha não perde um jogo no Europeu. O último foi em Alvalade, no Euro 2004, num duelo com Portugal decidido por Nuno Gomes.

A Espanha não parece ter o mesmo poderio de 2008 e 2012, mas mantém a filosofia. Seria difícil mudar, de resto, enquanto um homem como Iniesta estiver de batuta na mão a indicar o caminho.

Nem que seja no último suspiro.

O MOMENTO: Pirlo encarnado em Bonucci

Minuto 32 do Bélgica-Itália.

O jogo ainda estava naquela fase em que se desvaloriza a Itália. Em que se olha para o onze à procura de uma super-estrela, que não existe, em busca da qualidade patenteada noutros torneios, que também parecia longe. Até que alguém lembra o mais importante: é a Itália que ali está. A Itália.

E, sendo a Itália, muitas vezes, quanto mais fraca parecer, mais perigosa se torna.

Ainda por cima quando até os jogadores de outros tempos, que já não integram o grupo, parecem encarnar nos que lá estão. E, por ventura, nos mais improváveis. Bonucci, central da Juventus, fez a assistência do torneio, para o golo que abriu o ativo, marcado por Giaccherini.

A bola partiu antes da linha do meio campo, sobrevoou toda a gente, incluindo um mal posicionado Alderweireld. Aproveitou o médio do Bolonha. Dois toques e golo.

A Itália construiu a segunda vitória «folgada» (neste Euro ganhar por dois é um triunfo folgado) do Europeu, naquele que foi, provavelmente, o melhor dos jogos até ao momento. Tal como no Alemanha-Ucrânia, também agradável de seguir, o segundo golo veio só no período de descontos.

No final, os adeptos, através do site da UEFA, elegeram Giaccherini como o melhor em campo em Lyon, mas Bonucci não lhe ficou nada atrás.

Há quem consiga dizer o mesmo com muito mais piada, aliás.

A REVELAÇÃO: Jeff Hendrick

Grande parte da intensidade que a Irlanda conseguiu colocar no seu jogo, e que virou do avesso a imagem que tinha deixado há quatro anos, foi por culpa de Jeff Hendrick, um jovem de 24 anos com carreira construída, até ao momento, no Derby County, mas já a pedir outros voos.

Pelo menos a avaliar pela prestação desta tarde, onde foi o homem mais dos irlandeses. Aos 10 minutos, num remate pouco ortodoxo, a ganhar perigo depois de bater no solo, deu o primeiro aviso, que Isaksson sacudiu. Aos 33, ficou pertíssimo de marcar aquele que seria forte candidato a melhor golo do Euro. Um brilhante remate depois de tabelar com um colega à entrada da área, que a trave devolveu. No segundo tempo, já com o jogo 1-1, voltou a criar a melhor oportunidade da sua equipa, mas Isaksson levou novamente a melhor.

Quem é, então, este Jeff Hendrick? A verdade é que no projeto «Euro 2016 Network» do qual o Maisfutebol faz parte, já tinham avisado para o potencial do médio. Foi a resposta à questão: que jogador pode surpreender?

«Jeff Hendrick foi a maior revelação na campanha de apuramento, a par do guarda-redes Darren Randolph. Hendrick nem sequer era um titular habitual do Derby County quando saiu do banco para permitir a John O’Shea um empate tardio à seleção, na visita à Alemanha. A partir daí ganhou um lugar no onze e as suas movimentações a meio-campo e o critério na distribuição de jogo tornaram-se um ingredient habitual na campanha, tanto pelo meio como na esquerda. O seu drible e assistência para o golo vitorioso de Jonathan Walters, diante da Geórgia, foi beleza pura, e é notável o seu entendimento com Robbie Brady, com quem joga desde os 10 anos, quando se cruzaram no St. Kevin's Boys.»

Fora do campo, porém, o ano não foi tranquilo para Hendrick que viu o seu nome envolvido numa polémica grave. Foi acusado de integrar um grupo que retirou um homem de um táxi à força para, na sequência, o agredir, depois de uma confusão inicial numa discoteca. O caso ainda corre nos tribunais.

Enquanto isso, no relvado, Hendrick vai deixando a sua marca. Para a Irlanda vêm aí, agora, os jogos mais difíceis (Itália e Bélgica) e, por conseguinte, menor espaço para brilhar. Mas o Euro 2016 já não fica em branco para o médio do Derby County.

Aliás, durante o jogo, era assim que alguns adeptos o viam…

A DECEÇÃO: Marc Wilmots

É ponto unânime que a atual geração belga está recheada de talento e é, mesmo, uma das melhores de sempre do país. Contudo, já no último Mundial, pese a chegada aos quartos de final, tinha ficado a ideia que a equipa não produzia futebol para a qualidade que tem. E a estreia no Europeu não ajudou a desmistificar a ideia.

Ora, se umas vezes se critica o avançado que não marca, o médio que desaparece, o extremo que não cruza, o defesa que não tapa o caminho ou o guarda-redes que não fecha a baliza, noutras, e é o que começa a transparecer claramente neste caso, olha-se para o banco e questiona-se: será a pessoa certa?

Marc Wilmots ficou debaixo de fogo mal o apito final soou. O receio de que uma talentosa geração seja desperdiçada nas mãos de alguém que não está a conseguir mostrar no banco a mestria que tinha em campo fica cada vez mais forte.

Neste caso, a forma como mexeu na equipa foi o problema mais apontado. Primeiro tirando Nainggolan, que estava a ser o médio mais rematador, mostrando capacidade de chegada na área transalpina. Depois a troca de avançado por avançado (Lukaku, desinspirado, por Origi), praticamente a 15 minutos do fim e, como se sabe, já a perder. E, pouco depois, já com menos de 15 minutos para jogar, a mais ofensiva das mudanças, trocando o lateral Ciman por Ferreira-Carrasco.

Demasiado tarde.

Agora há dois jogos para emendar o trajeto. E, se Portugal cumprir a sua parte na perfeição, encontrar a armada de Fernando Santos nos oitavos de final.

A frase do dia

«Depois de tantos anos, é estanho olhar para trás e não ver o Casillas na baliza» Sérgio Ramos, defesa de Espanha

O Espanha-República Checa marcou o fim de uma era na seleção espanhola. Pela primeira vez desde 2002 o guarda-redes da seleção na fase final de uma grande competição não foi Iker Casillas. É preciso recuar até ao Euro 2000, quando Santiago Cañizares assumiu as redes, para ver Espanha sem o, agora, guardião do FC Porto na baliza.

David de Gea, mesmo assolado pelo escândalo de alegado abuso sexual que marcou a preparação espanhola, foi a escolha de Vicente del Bosque, depois de um ano de intensa pressão a pedir uma mudança.

Sobre a mudança, o técnico falou assim: «A colaboração de Iker Casillas tem sido fantástica. O Iker desde o banco também nos pode ajudar a qualquer momento. Tem tido um comportamento estupendo, é mais um jogador.»

Aliás, a forma como festejou o golo de Piqué foi notícia do outro lado da fronteira, onde o entusiasmo foi notório. Tal como, de resto, tinha acontecido na final da Taça de Portugal, quando também foi suplente de Helton, mas não escondeu a euforia quando André Silva empatou o encontro em cima da hora.

Aos 34 anos, Casillas enfrenta um novo capítulo na sua carreira internacional. E começa num dia em que, numa entrevista ao jornal italiano «Gazzetta dello Sport» ironizou com a retirada dos relvados: «Deixo de jogar quando o Buffon o fizer…»