O IAPMEI rejeitou esta terça-feira a possibilidade de o Boavista aderir ao PEC. Escrito assim assemelha-se a uma charada. Tentemos entender o que isto quer dizer.
O IAPMEI é o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação (antes Investimento).
Em 1998, o Governo entendeu que este instituto podia servir de intermediário entre empresas em dificuldades e credores. Avaliava a possibilidade de se fazerem acordos e planos de pagamento a médio e longo prazo. O objectivo último era salvar empresas com perspectivas de viabilidade.
O PEC é o Procedimento Extrajudicial de Conciliação. Uma empresa candidata-se, o IAPMEI analisa, pergunta a opinião dos credores. Se acreditam no sucesso, o PEC é concedido.
As empresas têm de cumprir diversas formalidades (ver link relacionado). O IAPMEI pode aceitar a candidatura ou recusá-la na hora.
Recusar é fechar a porta e dizer, no fundo, que não se acredita muito na recuperação da empresa.
Aceitar implica fazer o esforço de perguntar aos credores se acreditam. Se a resposta for sim, segue-se um longo processo de construção de um plano de pagamento/recuperação. Pode demorar, no máximo, seis meses (mais três de tolerância) a chegar a uma conclusão.
A história do Boavista
Que fez o Boavista? Candidatou-se. Que fez o IAPMEI? Aceitou o pedido e foi perguntar aos credores. Tudo bem? Depende.
De acordo com um decreto-lei de 2004 (artigo 4), o IAPMEI «deve recusar liminarmente o requerimento de conciliação» se entender que:
«1. A empresa é economicamente inviável
2. Não é provável o acordo entre os principais interessados na recuperação
3. Não é eficaz a sua intervenção para a obtenção do acordo
4. A empresa não se encontra em situação de insolvência, ainda que meramente iminente
5. Já se encontra ultrapassado o prazo para apresentação à insolvência, tal como fixado no n.º 1 do artigo 18.º do CIRE».
O IAPMEI tem quinze dias para pensar e informar, se recusar a candidatura.
Pois bem, que fez o IAPMEI no caso do Boavista?
Na semana passada aceitou o clube.
Ou seja, há oito dias os responsáveis do IAPMEI olhavam para a SAD do Boavista, um dos sete maiores credores portugueses do Fisco, e achavam-na capaz de chegar a um acordo com as Finanças. Aliás, não tiveram qualquer dúvida em aceitar que o Boavista, acossado por credores, em risco de não poder competir nos campeonatos profissionais e inscrito numa Liga quase sem receitas (a Vitalis), está longe de ser uma empresa inviável.
Uma vez que o pedido do Boavista não foi recusado, o clube obteve um documento. Assim que o entregou na Liga, ficou livre para poder inscrever jogadores. E na segunda-feira, em cima do prazo, conseguiu o número suficiente de contratos para poder participar numa prova profissional.
Parecia uma boa notícia, apesar de pelo meio as Finanças terem posto à venda o Estádio do Bessa. Mas como o imóvel pertence ao clube e não à SAD, tudo bem.
No entanto, de forma surpreendente, esta terça-feira o IAPMEI informou que afinal a SAD do Boavista não está em condições de aderir ao PEC. A razão, adiantada pela Agência Lusa, é singela: os credores não aceitaram.
Refere a notícia, e o IAPMEI devia saber (ou desmentir), o Boavista não cumpriu o PEC anterior.
Resumido: o Boavista já teve um PEC que não correu bem, deve mais de cinco milhões de euros ao Fisco, mais não se sabe bem quanto a quantos, mas mesmo assim o IAPMEI achou que talvez ainda houvesse uma possibilidade.
Num país a sério, este instituto seria obrigado a explicar os seus critérios. Em Portugal, salva-nos a certeza de que ainda há entidades crentes, dispostas a tudo para tentar ajudar.
No intervalo, o Boavista conseguiu o que queria: inscreveu-se. Se os clubes apostassem em credibilizar a indústria a que pertencem teriam há muito afinado os regulamentos da Liga, de forma a tornar justa e clara a competição. Mas isso não lhes interessa. Nunca se sabe quando um deles precisará de um PEC.